Capa da primeira edição de "Modern Architecture: A Critical History" (1980). Na capa, perspectiva axonométrica do projeto de Alberto Sartoris para a igreja e centro religioso Notre-Dame Du Phare (1931), curiosamente não incluída nas obras analisadas no livro.
Capa da primeira edição brasileira, intitulada "História Crítica da Arquitetura Moderna", numa reimpressão de 2003.
Abertura da segunda e principal seção do livro, intitulada "Uma história crítica, 1836-1967", na qual se analisa a produção da arquitetura moderna. A figura mostra a Casa del Fascio (Giuseppe Terragni, 1932-36) durante uma manifestação.
Abertura do último capítulo do livro em sua edição original, intitulado "Lugar, produção e arquitetura: por uma teoria crítica da construção" ["Place, Production and Architecture: towards a critical theory of building"], que passou por revisão na edição de 1985. No canto inferior direito, ilustrações de projetos de membros do Archigram: Sin Centre (Michael Webb, 1962) e Walking City (Ron Herron, 1964).
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O livro teve bastante reconhecimento desde sua publicação, embora também tenha recebido algumas críticas, sobretudo pelas ausências e pelo desequilíbrio no aprofundamento dos temas abordados. Destacou-se, no entanto, pela extensão do trabalho e por ter marcado uma importante mudança na historiografia da arquitetura moderna, ao se pretender como uma "história crítica". Frampton apresenta uma leitura historiográfica bastante distinta, se comparado a outros colegas e historiadores contemporâneos, pois não entende a arquitetura moderna como uma corrente de matriz unitária, e sim como uma história construída a partir de partes fragmentárias e até mesmo contraditórias.
Entre as principais referências teóricas para o livro, destacam-se as "Teses sobre a filosofia da história" (1940), de Walter Benjamin, e o ensaio "Construir, Habitar, Pensar" (1954), de Martin Heidegger, dos quais foram retiradas epígrafes para a introdução e o último capítulo da primeira edição, respectivamente. Com relação à historiografia da arquitetura moderna, destaca-se a influência da "Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina" (1960), de Reyner Banham.
A partir da segunda edição (1985), a obra ganha um caráter mais "operativo" quando lhe são incorporadas as reflexões - e prescrições - de Frampton sobre o chamado "Regionalismo Crítico". Posteriormente, contou ainda com outras duas edições para as quais foram elaborados novos capítulos que buscam atualizar o debate sobre a produção contemporânea: na terceira (1992) o autor analisa a produção em diferentes países evocando o tema da "prática reflexiva", proposta pelo sociólogo Donald Schön; e na quarta edição (2007) classifica a produção contemporânea a partir de seis categorias - topografia, morfologia, sustentabilidade, materialidade, habitat e forma cívica. O livro ganhou uma edição brasileira em 1997, traduzida a partir da terceira edição inglesa, e foi atualizada em 2008 e em 2015, já incorporando o novo capítulo acrescentado à quarta edição inglesa.
FRAMPTON, Kenneth. Modern architecture: a critical history. Londres; Nova York: Thames and Hudson, Oxford University Press,1980. Col. World of Art.
FRAMPTON, Kenneth (Ed.). Modern architecture and the critical present. Architectural Design, Londres, Profile 42, v. 52, n. 7/8, dez. 1982.
FRAMPTON, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1997.
FRAMPTON, Kenneth; ALLEN, Stan; FOSTER, Hal. A conversation with Kenneth Frampton. October, Cambridge, v. 106, p. 35-58, set./dez. 2003.
Kenneth Frampton, 1997 [1980]:
"Como muitos outros da minha geração, fui influenciado pela interpretação marxista da história; não obstante, mesmo a mais apressada leitura deste texto revelará que nenhum dos métodos tradicionais da análise marxista foi aplicado. De outro lado, é inegável que minha afinidade com a teoria crítica da Escola de Frankfurt influenciou minha visão de todo o período e proporcionou-me aguda consciência do lado escuro do Iluminismo, que, em nome de uma razão insensata, levou o homem a uma situação em que ele começa a ser tão alienado de sua produção como do mundo natural.
O desenvolvimento da arquitetura moderna depois do Iluminismo parece ter se dividido entre a utopia da vanguarda, formulada pela primeira vez no início do século XIX na cidade fisiocrática ideal de Ledoux, e a atitude anticlassicista, anti-racional e antiutilitária da reforma cristã, declarada pela primeira vez em 1836, nos Contrastes de Pugin. Desde então, em seu esforço de transcender a divisão do trabalho e as duras realidades da produção e da urbanização industriais, a cultura burguesa oscilou entre os extremos de utopias totalmente planejadas e industrializadas, de um lado, e, de outro, uma negação da realidade histórica efetiva da produção mecânica."
"A cidade finita, tal como chegou a existir na Europa ao longo dos quinhentos anos precedentes, foi totalmente transformada, no lapso de um século, pela interação de uma quantidade de forças técnicas e socioeconômicas sem precedentes, muitas das quais emergiam pela primeira vez na segunda metade do século XVIII. [...]"
"Nenhum estudo sobre os desdobramentos recentes da arquitetura pode deixar de mencionar o papel ambivalente que a profissão vem desempenhando desde meados dos anos 1960 - ambivalente não só no sentido de que, enquanto afirma ter sua atuação voltada para o interesse público, tem às vezes concorrido, sem espírito crítico, para reforçar o domínio de uma tecnologia otimizada, mas também no sentido de que muitos de seus membros mais inteligentes abandonaram a prática tradicional, tanto para dedicar-se à ação social direta quanto para entregar-se à projeção da arquitetura como uma forma de arte. No que diz respeito a este último aspecto, é impossível deixar de vê-lo como a volta de uma criatividade reprimida, como a implosão da utopia sobre si mesma. [...] Enquanto isso, como sugeriu Manfredo Tafuri, o objetivo da vanguarda de nossos dias consiste em legitimar a si própria através dos meios de comunicação ou, alternativamente, em redimir sua culpa executando isoladamente o rito do exorcismo criativo. Até que ponto este último pode servir como tática subversiva ('a injeção de ruído no sistema' de Archigram), ou como uma complexa metáfora com implicações críticas, é algo que depende, sem dúvida, da complexidade das idéias em jogo e da intenção subjacente ao empreendimento todo."
FRAMPTON, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1997, grifo do autor.
"As páginas deste último capítulo ['Lugar, Produção e Arquitetura: Por uma Teoria Crítica da Construção'] atestam o compromisso apaixonado de Frampton, que atravessa o 'matagal' do Modernismo não pelo relato detalhado de suas declarações polêmicas, e sim pelo questionamento das suas alianças não declaradas com a indústria, o Estado e a produção. Archigram, Milton Keynes, Aprendendo com Las Vegas e a cadeia Rossi/Grassi/Krier assomam como as contradições paradigmáticas da sociedade industrializada do final do século XX. Exemplificando, respectivamente, a utopia do consumo, o fim das nações e da cidade, o cinismo que resulta da paixão pela realidade e a nostalgia da razão, estas quatro estratégias da vida industrializada no final do século XX se tornaram, para Frampton, os inexoráveis impasses ideológicos com os quais o historiador espera abrir seu caminho pelas vielas labirínticas da arquitetura moderna."
PORPHYRIOS, Demetre. The thicket is no sacred grove. In: FRAMPTON, Kenneth (Ed.). Modern architecture and the critical present. Architectural Design, Londres, Profile 42, v. 52, n. 7/8, p. 56-57, dez. 1982, grifo do autor. Trad. livre: Leandro Cruz.
"[...] Não é por acaso que a sensibilidade crítica de Frampton entra em tensão com o ethos que ele mesmo herdou da ‘tradição do novo'. Benjamin e Heidegger, na verdade, não são inconciliáveis. No entanto, é preciso um trabalho de reconstrução histórica antes de iniciar um diálogo entre eles, o tipo de trabalho com o qual os leitores apressados de Lyotard dificilmente seriam capazes de lidar.
O livro de Frampton estimula corretamente a refazer as etapas que o Angelus Novus atravessa em seu vôo acidental e imprevisível. Mas é preciso interpretar o conceito de ‘pobreza' - aquele conhecido por Loos e Mies - de forma não-redutora. [...]"
TAFURI, Manfredo. Architecture and ‘poverty'. In: FRAMPTON, Kenneth (Ed.). Modern architecture and the critical present. Architectural Design, Londres, Profile 42, v. 52, n. 7/8, p. 57-58, dez. 1982. Trad. livre: Leandro Cruz.
"O livro Histórica crítica da arquitetura moderna supõe uma reinterpretação da arquitetura do movimento moderno na qual, sem recorrer às heterodoxias com as de [Erik Gunnar] Asplund ou de [Heinrich] Tessenow, a arquitetura moderna é tomada como uma corrente em evolução que tem raízes na Ilustração e no século XIX - destaca-se aqui uma herança de Peter Collins -, e cuja história não pode ser entendida de maneira utilitária, tal como pretendeu a historiografia moderna - [Nikolaus] Pevsner, [Sigfried] Giedion etc. -, mas deve ser desmontada como uma história necessariamente fragmentária e contraditória, na linha de Michel Foucault.
O livro traz, entretanto, uma flagrante contradição: por seu formato simples e por sua apresentação, assemelha-se a um livro de iniciação para estudantes de arquitetura; não obstante, numa leitura detalhada, o abuso de termos altamente especializados, que o autor nunca define, e os conteúdos, que não se dirigem a um público amplo, mas integram um debate de alta erudição com a elite de seus colegas arquitetos e críticos, revelam um conteúdo de grande complexidade e pouco acessível aos leitores não iniciados."
MONTANER, Josep Maria. Arquitetura e crítica. 2. ed. Barcelona: Gustavo Gili, 2007, grifo do autor.
"Frampton: O Pop veio, em grande medida, da exposição This Is Tomorrow, especialmente com o trabalho de Richard Hamilton. Meu contato com Hamilton no começo dos anos 1960 também veio através da revista Architectural Design. Achava Hamilton uma figura muito interessante, e ainda acho. Quanto à [Reyner] Banham, o seu Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina (1960) foi bastante influente. Foi, sem dúvidas, um modelo para meu História crítica da arquitetura moderna (1980).
Foster: De que maneira?
Frampton: Banham organizou seu livro em tópicos claros, onde cada um se relaciona a um movimento de vanguarda específico; ele também citou os próprios protagonistas. Achei estes dois aspectos muito eficazes, então eu os emulei.
Foster: E sobre sua revisão em particular do cânon da arquitetura moderna, produzida pela primeira geração de historiadores como Nikolaus Pevsner e Siegfried Giedion - a sua declaração de que, ao deixarem de fora os arquitetos futuristas e expressionistas, eles não conseguiram articular o que era verdadeiramente moderno na arquitetura moderna, isto é, sua expressão da ‘era da máquina'? Essa ênfase parece um tanto estranha para você.
Frampton: É uma questão complexa. Como você mesmo diz, o livro de Banham é energizado por sua redescoberta do Futurismo e eu achei aquela reavaliação muito importante. ‘The Foundation and Manifesto of Futurism' (1909) é anterior e, em certos aspectos, mais radical do que os manifestos russos subsequentes e sempre me pareceram como a expressão por excelência da cultura de vanguarda, sobretudo do ponto de vista retórico, com sua euforia agressiva em relação à modernidade. É esta abertura para o Futurismo que impulsiona o livro e que continua sendo impressionante. O que é incômodo em Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina - e isto mais uma vez tem a ver com [Alan] Colquhoun, que fez uma importante crítica do livro, mas que também era evidente para mim por conta de minhas experiências na Architectural Design - é sua defesa total de Buckminster Fuller, um posicionamento que eu achei injustificável, e ainda acho. Banham termina com Fuller como o novo deus ex machina da cena. E também os efeitos dos Estados Unidos sobre Banham e sobre mim foram completamente diferentes. De alguma maneira, os Estados Unidos me politizaram..."
"Allen: Além da publicidade, também havia uma atmosfera de experimentação no Instituto [IAUS], um clima de laboratório que era muito produtivo. Uma vez que nada estava sendo construído, havia uma exploração intensa de formas, fontes e meios de representação. Esse foi o lado positivo do período, e muito dele foi incubado no Instituto.
Foster: Foi neste ambiente que você escreveu História crítica da arquitetura moderna. Como foi que isso aconteceu?
Frampton: Fui contratado para escrever esse livro em 1970; levei dez anos para terminá-lo. A pessoa que o encomendou foi Robin Middleton, que na época era um editor de aquisições na Thames and Hudson. Por coincidência, Middleton tinha me substituído como editor técnico da Architectural Design. O livro era muito mais extenso do que a editora queria, então era uma luta constante para escrever o mais economicamente e laconicamente possível - o que talvez explique parte da sua densidade.
Foster: Você falou sobre a relação do seu livro com Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina, de Banham. Quais foram os outros pontos de referência para você, especialmente em termos de como você desenvolveu o seu cânon da arquitetura do século XX? O quão premeditado foi o livro em suas recuperações e revisões?
Frampton: Certamente Leonardo Benevolo foi uma influência, primeiro pelo seu As Origens da Urbanística Moderna (1963; traduzido para o inglês em 1967) e, em seguida, pela sua História da Arquitetura Moderna (1960; traduzido para o inglês em 1971). Tony Vidler também foi uma influência importante, particularmente no capítulo ‘Tony Garnier e Cidade Industrial', que foi alimentado por várias conversas com ele.
Foster: Mas você acha - assim como Banham em 1960 - que Pevsner, Giedion, e Bruno Zevi, de algum modo, interpretaram a história de forma equivocada?
Frampton: Eu nunca achei o livro do Pevsner, Os Pioneiros do Desenho Moderno (1936), particularmente interessante. Ainda considero Giedion estimulante, ao retomar eventualmente as páginas de Espaço, Tempo e Arquitetura (1941). Mas o livro de Banham foi o meu modelo."
FRAMPTON, Kenneth; ALLEN, Stan; FOSTER, Hal. A Conversation with Kenneth Frampton. October, Cambridge, v. 106, p. 35-58, set./dez. 2003, grifos dos autores. Trad. livre: Leandro Cruz.
"Nos comentários de Frampton sobre Brasília, um chama atenção especial por colocar em discussão, uma vez mais, a relação entre projeto urbano e desigualdades sociais [...]
Mais que a segregação social encontrada na nova capital brasileira - principalmente a capital de um país capitalista subdesenvolvido -, a crítica de Frampton se dirige aos princípios que orientam as propostas urbanísticas de Le Corbusier.
À parte dessa crítica bastante comum entre os historiadores, estão as arbitrariedades também habituais nas comparações feitas entre Chandigarh e Brasília, que se fazem acompanhar de imprecisões [...]."
TINEM, Nelci. O alvo do olhar estrangeiro: o Brasil na historiografia da arquitetura moderna. 2. ed. João Pessoa: Editora Universitária, 2006.
"Um preocupante viés eurocêntrico domina quase todas as principais histórias da arquitetura moderna, desde Die Baukunst der neuesten Zeit (1927), de Gustaf Adolf Platz, até Theory and Design in the First Machine Age (1960), de Reyner Banham, à qual o presente livro muito deve. Apesar da discrição ideológica com que Platz e Banham deixaram de fora de seus títulos qualquer menção à arquitetura ou à modernidade, ainda assim eles se inserem na polêmica tradição historiográfica que o historiador marxista Manfredo Tafuri chamou de 'operativa', isto é, de ideologicamente instrumental. A esse respeito, é preciso admitir que a última edição desta obra continua mais operativa do que nunca, com toda a fragilidade arbitrária que isso acarreta."
FRAMPTON, Kenneth. Prefácio à quarta edição. In: FRAMPTON, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2015. p. VII-VIII, grifos do autor.
"[JM] Como o senhor chegou ao que é basicamente o livro de muitas gerações, História crítica da arquitetura moderna?
[KF] Aqui entra Robin Middleton. Foi uma encomenda dele, que era diretor de aquisições de arquitetura na [editora] Thames & Hudson. Acho que ele me escolheu depois que eu escrevi um texto de análise do Palácio dos Soviets projetado por Hannes Meier e Le Corbusier. Acredito que esse texto o tenha impressionado. Theo Crosby me escolheu para o cargo na AD [Architectural Design], e quando deixei a revista, Middleton me substituiu. A História crítica que eu tentei escrever era muito difícil, por causa do tamanho. Foi uma grande luta. Middleton é um ótimo editor, em certos momentos é literalmente o editor do texto. Claro que fui muito influenciado por [Reyner] Banham, e eu nunca falei o bastante sobre isso. Teoria e projeto na primeira era da máquina é realmente um livro decisivo, porque dá voz diretamente às figuras. Isso não acontece com [Sigfried] Giedion, ou com [Leonardo] Benevolo, ou com Arnold Whittick. O uso seletivo que Banham faz das vozes das figuras que estão envolvidas no momento histórico é brilhante. Tentei fazer o mesmo no meu livro. Ele me consumiu quase dez anos."
FRAMPTON, Kenneth; MORENO, Joaquim. Entrevista: Kenneth Frampton. Projeto Design, São Paulo, n. 409, abr. 2014. Disponível em <http://arcoweb.com.br/projetodesign/>. Acesso em: 23 jul. 2014.