1989
Reino Unido
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Paisagem, Planejamento Urbano
Colaborador
Leandro Cruz
Citado por: 1
No livro em questão, o autor faz um ataque à herança da arquitetura moderna e defende a retomada de princípios tradicionais para arquitetura, com vistas a preservar o aspecto das cidades e conseguir a aprovação dos usuários. Os arquitetos Hassan Fathy, Andrés Duany e Léon Krier ganham destaque no livro como representantes de ideias com as quais o autor simpatiza, sendo a cidade de Seaside, no Golfo do México, apresentada como um modelo. Também são lançadas críticas a grandes projetos urbanos em andamento na Inglaterra naquele momento, como a renovação do centro de Birmingham, as ações na região das Docklands, em Londres, e - fazendo a abertura do livro - retoma-se a crítica à proposta ganhadora do primeiro concurso para a Ala Sainsbury da National Gallery (anterior à versão de Venturi, Rauch e Scott Brown, que foi cronstruída).
O autor apresenta um decálogo de princípios que levam em conta a maneira tradicional de se fazer cidades no universo europeu: o lugar [the place], hierarquia [hierarchy], escala [scale], harmonia [harmony], lugares protegidos [enclosure], materiais [materials], decoração [decoration], arte [art], letreiros e iluminação [signs & lights] e comunidade [community]. Em seguida, comenta-se sobre a tradição da família real em se envolver nos debates e na produção arquitetônica ao longo de sua história, para em seguida mostrar, entre outras de suas ações, o interesse em desenvolver uma proposta experimental para o Ducado da Cornualha, com projeto de Léon Krier. O projeto é conhecido como Cidade Nova de Poundbury, teve suas obras iniciadas ainda em 1993 e desde então vem sendo executado e expandido.
O livro de 1989, somado à participação do Príncipe Charles nos debates sobre arquitetura e projetos urbanos, geraram intensa repercussão nos anos 1980-90. Na edição de dezembro de 1990 da revista The Architectural Review, um editorial assinado por Peter Davey buscava mostrar com os "Dez Princípios" mostravam-se adequados, mas poderiam ser encontrados dentro da própria tradição da arquitetura moderna, sem precisar recair na produção de pastiches. Reações mais críticas vieram da parte de arquitetos do chamado high-tech, como Norman Foster e Richard Rogers - que, por sua vez, já tinham sido alvo do Príncipe na polêmica sobre o "carbúnculo monstruoso" - e do crítico e historiador Charles Jencks.
HRH The Prince of Wales. A vision of Britan: a personal view of architecture. Londres: Doubleday, 1989.
MALLGRAVE, Harry Francis; GOODMAN, David. An introduction to architectural theory: 1968 to the present. Chichester: Wiley-Blackwell, 2011.
SAR O Príncipe de Gales, 1989:
"As teorias da arquitetura em voga nos anos 50 e 60, seguidas tão servilmente por aqueles que queriam ser considerados ‘por dentro', geraram monstros deformados que vêm assombrando nossas cidades, aldeias e campos. Resultado de trinta anos de experimentação com materiais de construção revolucionários e ideias inovadoras, queimando todos os manuais e oferecendo a teoria de que o homem é uma máquina, acabamos com estranhos monstros Frankenstein, desprovidos de caráter e, em geral, não muito admirados, a não ser pelos professores que inventaram esses horrores em seus laboratórios - e mesmo eles, depois de certo tempo, consideram suas criações um pouco difíceis de serem aceitas. O resto de nós somos constantemente forçados a suportar os resultados de suas experiências e - a julgar pelas reações ao filme que eu fiz com a BBC, A Vision of Britain - poucas pessoas estão satisfeitas com a situação."
"Foi esclarecedor conversar com Andres Duany, o arquiteto de Seaside [...], porque ele desenvolveu com profundidade suas teorias sobre um código de construção e suas ideias estão sendo vistas com grande interesse por todo os Estados Unidos. Seu código já foi aplicado tanto em comunidades de classe média quanto em áreas urbanas centrais em crise. Muitas vezes se esquece que a ideia de um código remonta ao mundo clássico antigo. Os códigos são parte da nossa civilização. Eles foram empregados em toda a Europa, onde Paris, Bolonha, Praga, Edimburgo (na minha opinião a mais bela cidade da Grã-Bretanha), Viena e Siena - que foi mencionada no filme - foram o resultado de arquitetos e construtores trabalhando dentro de uma estrutura comum."
"Quando estava realizando a pesquisa para o meu filme sobre arquitetura, tornei-me ainda mais consciente da ineficácia das regras de planejamento atuais e dos regulamentos para se criar um ambiente melhor. [...]
Pareceu-me que valeria a pena olhar para esta questão, então considerei as opiniões e os conselhos de todos aqueles que tivessem um profundo interesse no assunto e o resultado foi decantado em um novo conjunto de sugestões de regras básicas. Afastando-me um pouco e observando o que vem acontecendo da forma mais objetiva possível, pude notar que parece que nos esquecemos de alguns dos princípios básicos que governam a arquitetura desde os gregos. Muitos deles são tão simples quanto o senso comum, como as leis da gramática que geram uma linguagem."
"Espero colocar em prática alguns destes princípios em Dorchester. O tráfego nos dias de descanso afeta drasticamente o centro da cidade, de modo que eles construíram, finalmente, um anel viário. Entre o anel viário e o centro da cidade há cerca de 350 acres de terras do Ducado da Cornualha, para onde a Câmara do Distrito de West Dorset espera ansiosamente que a cidade acabe se expandindo. Eles pediram ao Ducado um plano de desenvolvimento de longo prazo."
HRH The Prince of Wales. A vision of Britan: a personal view of architecture. Londres: Doubleday, 1989, grifos do autor. Trad. livre: Leandro Cruz.
"Agora mesmo os classicistas resolveram sair da toca, incentivados pelos comentários do Príncipe e pelo sucesso do Classicismo Pós-Moderno corporativo da América do Norte. Eles anseiam por empregar seu estilo e regular a Grã-Bretanha num grande decoro de porta-para-fora, não importa o que aconteça por detrás de suas belas fachadas. Estão loucos por uma congruência de gosto aprazível, em que as cidades tenham a aparência - pelo menos - do século XVIII, antes que coisas desagradáveis como a indústria moderna tivessem surgido. Eles querem esconder o fato de que vivemos em uma sociedade plural, tecnológica e multicultural, com muitas necessidades, tipos construtivos e possibilidades urbanas novos.
O posicionamento do próprio Príncipe de Gales é muito mais moderado do que o de alguns dos seus apoiadores. Embora suas preferências estejam inclinadas para o classicismo e ele tenha uma paixão forte pelo verdadeiro vernáculo da velha Inglaterra, ele está disposto a elogiar o singular edifício moderno em seu cativante A Vision of Britain. Ao invés de forçar o argumento para apenas um estilo, ele apresenta ‘Dez Princípios sobre os quais podemos nos apoiar'. E embora os princípios tratem basicamente da aparência externa, poucos de nós poderiam discordar deles fundamentalmente. O problema é que eles são ilustrados principalmente com exemplos históricos, o que dá a impressão de que eles só podem ser alcançados se todos nos tornamos plagiadores [pasticheurs].
Esta edição [da The Architectural Review] quer demonstrar que o pastiche é completamente desnecessário; que os princípios podem ser e vêm sendo realizados dentro do próprio Modernismo, particularmente nos últimos anos. E que o Modernismo tem outras coisas a oferecer, no presente para o futuro, que podem acrescentar e enriquecer os princípios."
DAVEY, Peter. Without pastiche. The Architectural Review, Londres, n. 1.126, p. 21-39, dez. 1990, grifo do autor. Disponível em <http://www.architecturalreview.com/>. Acesso em: 29 set. 2015. Trad. livre: Leandro Cruz.
"O ‘gabinete doméstico' de conselheiros do Príncipe Charles sobre questões vinculadas à arquitetura e ao projeto urbano inclui o arquiteto Leon Krier. As queixas de Krier contra o modernismo, tal como publicadas (manuscritas, para obter um efeito especial) em 1987 em Architectural Design Profile (nº 65), nos interessam diretamente, visto que hoje dão forma ao debate público na Inglaterra tanto no nível mais elevado como no mais geral. O problema central para Krier é que o planejamento urbano modernista trabalha quase sempre com o zoneamento monofuncional. Como resultado, a circulação de pessoas entre zonas por meio de artérias artificiais se torna a principal preocupação do planejador, gerando um padrão urbano que é, ao ver dele, ‘antiecológico', por ser uma perda de tempo, de energia e de espaço [...]"
HARVEY, David. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 17. ed. São Paulo: Loyola, 2008, grifo do autor.
"O texto [Arquitetura sociológica] é otimista: identifica as frentes em que o conhecimento científico em arquitetura está sendo produzido. Todavia, como acontece nas demais ciências humanas (dizem que nas exatas também...), paradigmas conflitantes vão co-existir enquanto vivermos em sociedades com interesses contraditórios: elas produzem idéias à sua imagem e semelhança. Por um lado, Hillier, Mitchel e Anderson lançam novas luzes sobre velhos temas; por outro, produzem-se ‘manifestos' com cheiro de mofo: a Carta do Novo Urbanismo (Congress for the New Urbanism, 2001), a Nova Carta de Atenas (Conselho Europeu de Urbanistas, 2003), o livro A Vision of Britain, de Sua Alteza Real o Príncipe de Gales (The Prince of Wales, 1989). O último embasou o projeto retrô e a construção de Poundbury, a ‘nova' cidade ‘medieval' inglesa, em que participaram entusiasticamente Léon Krier e Andrés Duany, papas do ‘novo urbanismo'."
HOLANDA, Frederico de. Arquitetura sociológica. RBEUR - Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, São Paulo, v. 9, n. 1, p. 115-129, mai. 2007, grifos do autor. Disponível em <http://unuhospedagem.com.br/revista/rbeur/>. Acesso em: 15 set. 2015.
"Criar o grupo dos novos urbanistas na Europa no ano de 2003, foi iniciativa inspirada no movimento norte americano de mesma raiz. O Congresso para o Novo Urbanismo, CNU estabelecido nos Estados Unidos da América, EUA dez anos antes, a publicação da Carta do Novo Urbanismo em 1996 e, a grande repercussão do novo urbanismo neste país são fatos que precederam à iniciativa européia. Não só o exemplo americano, mas o momento de abertura para a crítica ao Urbanismo Moderno favoreceu a fundação da congênere européia, o Conselho Europeu de Urbanismo, CEU."
"No plano intelectual e, com certeza mexendo com a vontade de o nobre ser teorista social, o novo tradicionalismo inspirou Charles, Príncipe de Wales a idealizar e empreender a implantação do bairro Poundbury, extensão da cidade de Dorchester. Isto foi em 1989, em uma área de 162 ha, com previsão de uso misto entre 1200 habitantes e a instalação de cerca de 40 unidades destinadas a comércio, serviço e indústrias leves. O projeto para Poundbury apesar de sua pequena dimensão, reflete princípios urbanísticos estabelecidos pelo Príncipe Charles e que foram levados a pratica pelo escritório do arquiteto Leon Krier. Dirigida pelo príncipe a Prince of Wales Foundation for the Built Environment, com a colaboração de outros urbanistas, desdobrou os oito princípios do Príncipe para treze princípios a serem seguidos no planejamento e projeto de um espaço agradável para a vida das pessoas. [...]."
MACEDO, Adilson Costa. O novo urbanismo na Europa. Arquitextos, São Paulo, ano 08, n. 094.03, mar. 2008. Portal Vitruvius. Disponível em <http://vitruvius.com.br/>. Acesso em: 15 set. 2015.
"Um novo tradicionalismo impôs sua agenda no começo da década de 1990. Recorrendo a várias referências históricas, os teóricos americanos do chamado novo urbanismo propõem uma expressão urbana do pós-modernismo. Mesmo assim, revelam um conservadorismo menos obstinado que o do Príncipe de Gales, um entusiasta da arquitetura cuja cidade passadista de Poundbury, nos arredores de Dorchester, projetada por Léon Krier, começara a ser construída em 1989. [...]"
COHEN, Jean-Louis. O futuro da arquitetura desde 1899: uma história mundial. São Paulo: Cosac Naify, 2013.
"Este período [a década de 1970] acompanha e marca, essencialmente, o fim de uma crença irrestrita nos méritos da arquitetura moderna. Em 1972 é demolido o conjunto habitacional Pruitt-Igoe em St. Louis, um evento geralmente alardeado pelos críticos como o fim da arquitetura moderna e, em escala ampliada, o fim das visões utópicas modernas para a cidade. Após a demolição de Pruitt-Igoe, a confiança na profissão da arquitetura é fortemente abalada. O clima fica contemplativo e as principais obras seminais de arquitetura não são mais propostas, e sim livros; não mais visões, e sim reflexões. É revelador que o manifesto arquitetônico mais digno de nota de 1989 - ano da queda do Muro de Berlim e o início de uma incontestável ordem global do capitalismo - seja A Vision of Britain, do príncipe Charles. A era moderna, prefigurada no Manifesto Futurista em fins do oitocentos, com suas hegemonias hereditárias, termina ironicamente com um manifesto antimoderno, escrito por um membro da família real britânica."
GRAAF, Reinier de. Comment - Reinier de Graaf. The Architect's Newspaper, 10 jan. 2015, grifo do autor. Disponível em <http://www.archpaper.com/>. Acesso em: 14 out. 2015. Trad. livre: Leandro Cruz.